"Abre a segunda das três gavetinhas do toucador. Vasculha entre os pentes, presilhas e grampos e puxa lá do fundo a tesoura negra, pesada. É uma tesoura velha, pertenceu a sua avó paterna. Acaricia a lâmina afiada e escuta. Passa a tesoura pelo rosto com cuidado, sentindo a frieza do metal. Não quer mais viver se for para estar longe dele. Para quê? Aguentar uma lenta sucessão de dias iguais, fingir-se interessada pela guerra, pelas vitórias, pelo sangue derramado, por aquela república... Ver outros verões, suar outras tantas tardes até que chegue um inverno, e mais outro e mais outro, até que o Minuano estoure em seus tímpanos, corroa sua alma, até que envelheça numa cadeira de balanço, olhando o pampa, feito um fóssil. A tesoura pesa entre os seus dedos. A tesoura espera uma decisão."
(A casa das sete mulheres)
Nenhum comentário:
Postar um comentário